5 de agosto de 2011

Ontem eram anónimos, hoje são de testes.

Muito sinceramente, parece-me disparatado o alarido que se está a fazer em torno da chamada de “teste” que a deputada do PSD, Joana Barata Lopes, fez para o 112.
Numa altura em que muitos defendem, eu inclusive, que um dos problemas da sociedade actual se prende com a perda de valores que outrora nos regiam, acho até salutar que a jovem deputada tente recuperar o prazer sublime que outrora a minha geração sentia ao fazermos, também nós, magníficas chamadas de “teste”.
Ainda me lembro, como se fosse hoje, daquelas tardes de Inverno em que a chuva nos impedia de irmos para a rua brincar, como era costume de então, e que nos víamos forçados a ficar fechados em casa, coisa que nos deixava inquietos e que nos aguçava o espírito para as mais inusitadas brincadeiras.
Uma delas, claro está, era a de fazer telefonemas de “teste” para gozarmos com o incauto interlocutor que nos atendia do outro lado.
Perdi a conta ao número de vezes em que isso aconteceu lá em casa. Convidava-se os amigos para uma tarde de Monopoly, fechávamo-nos na sala, com o tabuleiro no chão e por ali permanecíamos entretidos a comprar e a vender a Rua Augusta ou a Luísa Todi do bairro Azul Claro, até que a dada altura, um lembrava-se :

- Epá ! vamos fazer telefonemas anónimos (hoje diz-se de “testes”, é politicamente mais correcto).

Acto contínuo, colocávamos um de guarda à porta da sala, para controlar a eventual chegada da minha Mãe, que estava na marquise agarrada à máquina de costura a fazer vestidos para fora, e lá desatávamos nós a fazer chamadas anónimas.
A primeira vítima, invariavelmente, era o Sr. Franklim do talho. Já sabíamos o seu número de telefone de cor, pegávamos naquele grande e volumoso aparelho preto (eram todos pretos, ou quase todos, porque o Orlando tinha um telefone vermelho na casa dele, que o Pai, que era da Marinha, tinha trazido de “fora” e que era um verdadeiro luxo !) e que tinha um disco perfurado para marcar os números que fazia um barulhão desgraçado, e lá atacávamos nós tentando, ao máximo, fazer uma voz afeminada :

- É do talho do Sr. Franklim ?
- É sim, faz favor ?
- O Sr. Franklim tem mão de porco ?
- Sim tenho.
- Então como é que está a segurar no telefone ?

Era a risada geral. Desligávamos rápido porque, vá-se lá saber porquê, aquela coisa de fazer chamadas anónimas era, para nós, algo muito perigoso e que nos obrigava a todos os cuidados para não sermos apanhados.
Outra brincadeira corrente era a de pegarmos na lista telefónica e procurarmos nomes que se prestassem ao gozo, como por exemplo Leitão, Carvalho (que subitamente, e algures na conversa perdia o “v”, para rimar com algo mais …), e por aí adiante.
Tudo isso se perdeu. Porque os telefones se generalizaram, porque passaram a identificar a chamada e, acima de tudo, porque com os preços praticados pelos operadores de comunicações, essa brincadeira hoje atinge valores proibitivos.
Portanto, termos uma representante do nosso governo que tentou, com custos avultados para a sua pobre conta bancária, reavivar o espírito que reinava nos anos 70 e 80 dos telefonemas anónimos, deveria merecer da parte de todos nós um aplauso e não um chorrilho de críticas como se tem visto.

Podem, isso sim, é dizer à Sra. Deputada que tendo a conta a sua idade e a posição que ocupa, da próxima vez que lhe apeteça brincar aos telefonemas anónimos, que o faça ligando mas é para o Sr. Car(v)alho … vai ver que vai gostar, Sra. Deputada !

8 comentários:

  1. Muito bom conselho, Eduardo!

    Até parece mentira mas que diabo de coisa terá passado pela cabeça da sra. deputada para se pôr a fazer telefonemas anónimos para teste?!

    Aprendizes de feiticeiro/a é o que é! Está difícil encarrilar!...

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  2. Caro António, estes partidos que têm partilhado o poder, tornaram-se alvos apeteciveis para quem pretende encontrar ali uma forma de se "safar" na vida. Deixaram de ser partidos servidos por gente com principios ideológicos e que veja na politica uma forma de fazer evoluir e melhorar as condições de vida dos Portugueses.

    E quando assim é, o resultado são situações como esta.

    É pena, mas á assim mesmo !

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  3. Fernando, para um "periquito" até que não me estou a safar mal na escrita, hem ?

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  4. Bom dia
    Depois de me rir a bandeiras despregadas dou-te os parabéns por esta história bem contada e revivida aí na primeira pessoa.
    Aqui não havia telefones. Para dar um recado diziam aos meninos:
    - vais num pé e vens no outro....
    Isto quando os recados eram entre famílias da mesma aldeia.
    Ora hoje alem das chamadas que nos fazem por tudo e por nada também temos de gramar com os testes políticos.
    Aqui só para nós
    Os Deputados tem muita falta de assunto!....e até há aqueles que à vista de todos metem os gravadores no bolso, alçam a caganita e põem-se à distância «quem é tu...quem sou eu...»

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  5. Bom, Luís, se ao menos tive o condão de te pôr a rir, já me dou por satisfeito.

    A falta de qualidade de quem nos tem (des)governado atinge de facto patamares de vergonha nacional.
    Mas que fazer ?
    As pessoas parecem gostar, continuam a colocá-los lá.
    Até um dia ... espero eu !

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  6. Eduardito,

    No fundo, e sem qualquer cunho saudosista, que felizes eramos com brincadeiras tão singelas.
    Hoje, as crianças, e mesmo os adolescentes (alguns, claro, não vamos generalizar!) não sabem brincar, perderam a noção do lúdico.
    A Srª. Deputada? Olha, nem me apetece comentar! Há coisas quase que inclassificáveis.
    Andamos todos a brincar?
    O problema é que a brincadeira é só para alguns.
    Beijinho.

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  7. Teresa, foi de facto uma atitude disparatada da Sra. deputada que, embora sem causar qualquer dano, diga-se, não é uma atitude apropriada, em especial para quem, nesta altura, ocupa o cargo que ela ocupa.

    No fundo, é apenas e só, mais uma atitude que reflecte bem o baixo nível da classe política governante que temos tido a (des)governar-nos.

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