19 de agosto de 2011

Revelador.

O assunto que me leva a escrever este post é, a meu ver, de tal forma importante e relevante que, mesmo apelando à minha maior capacidade de síntese, acabou por sair este “lençol” que abaixo vos deixo. A verdade é que para expor correctamente a minha opinião sobre esta matéria era impossível fazê-lo por meias palavras e deixando muito por dizer.

A actual visita Papal a Espanha reveste-se, juntando todos os acontecimentos ocorridos até ao momento, dum carácter verdadeiramente revelador e que ajuda a melhor entender aquilo que é e que tem sido a história da Igreja Católica e do seu posicionamento perante o Mundo e os seus Povos.
Numa altura de profunda crise mundial como aquela que vivemos, têm sido constantes as aparições de Padres, Sacerdotes e até mesmo do seu Sumo Pontífice a apelar à caridade, á fraternidade e à ajuda ao próximo, como formas de se ajudar a combater e a mitigar a pobreza e a fome que grassam, cada vez mais, em todo o Mundo.
A verdade, porém, é que as acções da Igreja Católica estão longe de corresponder ao seu próprio diálogo e entram mesmo em contradição com este.
Numa altura em que a Espanha (assim como Portugal no ano passado, mas foquemo-nos por ora na Espanha) atravessa uma situação delicada em termos económicos, a IC (Igreja Católica) decide fazer uma visita a este país e, claro está, ás expensas do Governo Espanhol.

Aqui ficam, desde logo, bem patentes três situações inaceitáveis :

1º Apesar da fortuna colossal (e aqui o termo é bem empregue) que sempre caracterizou e reinou na instituição religiosa que é a IC, esta continua a viver, faustosamente, do “dízimo” alheio.

2º A forma como Estados Laicos se vergam perante as exigências da IC é, só por si, revelador da forte influência que a mesma ainda exerce nas governações desses países. Nem todos os Espanhóis são católicos, mas é com o dinheiro dos impostos de todos eles que esta, e outras viagens, são pagas.
Não creio que as visitas de líderes de outras religiões também tenham sido, ou venham a ser, suportadas pelos governos laicos como é o caso do Espanhol.

3º As visitas Papais são, sem qualquer sombra de dúvida, as maiores acções de merchadising a que o mundo assiste hoje em dia, e o mais incrível é que a IC é a única instituição no mundo que o faz de forma totalmente grátis.

Outro aspecto que convém realçar relativamente a esta visita Papal tem que ver com as querelas que daí resultaram anteontem e ontem na Praça Puerta del Sol, e com o tratamento diferenciado que foi dado aos fiéis católicos relativamente àqueles que se manifestaram contra a visita Papal.
Durante a tarde e início da noite, a referida Praça foi-se enchendo de fiéis que assim pretendiam manifestar o seu contentamento e alegria pela visita Papal, e quando isso aconteceu as forças de intervenção não foram chamadas ao local. Mais tarde, também de forma ordeira e pacífica, a mesma praça foi acolhendo milhares de pessoas que pretendiam assim manifestar o seu descontentamento e discordância com a referida visita Papal, mas aí, as autoridades competentes solicitaram a intervenção policial com vista à retirada daquela praça, daqueles que se manifestavam pacificamente (realço que foi sempre de forma pacífica, e que os únicos actos de violência foram praticados pelas forças policiais, não se tendo verificado algum confronto entre os manifestantes e os fiéis e não tendo sido registado nenhum ferimento entre os fiéis ou forças policiais, o mesmo não acontecendo em relação aos manifestantes que sofreram vários ferimentos) contra a visita do Papa.

Não contente com todo este triste cenário, e ao invés de tentar pôr alguma água na fervura eis que, no seu discurso de ontem, o Sr. Ratzinger opta por um discurso duro, e pejado de inaceitáveis críticas aos não católicos. Um discurso que terá sido, não tenho dúvidas nenhumas disso, o mais inquisidor discurso da IC desde os tempos da famigerada Inquisição.
Um discurso carregado de ódio contra os Ateus, e onde o Papa apela, de forma clara e veemente, a que os fiéis deixem de pensar pela sua própria cabeça e passem a obedecer de forma cega e acéfala ao que a IC os manda fazer.

É no mínimo deplorável que o mundo tenha ontem assistido a tamanhas atrocidades proferidas pelo Papa Bento XVI, e mais deplorável ainda, que os órgãos de comunicação social, sempre tão ávidos de notícias escaldantes, passem (de forma evidentemente concertada) ao lado destas palavras, não lhes dando a atenção e o destaque que as mesmas mereciam.

Se a tudo isto juntarmos, aquilo que também ainda não vi referido em nenhum órgão de comunicação social, que é o mais profundo silêncio da IC relativamente aos recentes atentados ocorridos na Noruega, perpetrados por um individuo que se declarou como Fundamentalista Cristão, e que afirmou que o motivo dos seus actos se ficou a dever ao seu ódio contra os impuros (no caso, os não católicos), fica bem claro que, para a IC, o actual cenário de crise económica, social e humanitária em que o mundo mergulhou, se tornou num terreno fértil para tentar recuperar o seu poder e influência sobre as populações, já não se coibindo de mostrar, até pelas palavras proferidas ontem pelo seu representante máximo que, caso lhes seja permitido, a ressuscitação dos tempos da Inquisição estará para breve.

10 comentários:

  1. Aí está um «lençol» que se começa a ler, que se lê até ao fim e que, acabada a leitura, nos faz dizer: valeu a pena.

    Bom texto.

    Um abraço.

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  2. Eduardo,

    Subscrevo cada uma das tuas palavras, não para ser simpática, mas porque SINTO e VEJO a igreja, ou melhor, os seus representantes, exactamente como tu.
    Apenas saliento mais um aspecto que me indigna, me revolta, me...

    O que dizer do poderio económico do Vaticano? O que dizer de um Estado dentro de outro Estado?

    Não, não foi isto que Cristo pregou, mesmo aos olhos dos ateus.

    Beijinho.

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  3. Fernando, parece que é chegada a hora de se inverterem os papeis, agora, parece que têm de ser os ateus a espalhar a palavra de ... Ateu !

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  4. Teresa, fico feliz de teres captado uma das partes significativas da mensagem que quis passar, isto é, em momento algum ponho em causa a fé e a devoção dos crentes.
    O que ponho em causa, e aquilo que me causa revolta é a postura e a forma de actuar da "Igreja".
    Vejo que entendeste perfeitamente o que quis dizer e isso agrada-me.

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  5. Caro amigo Eduardo

    Venho por esta via manifestar a minha concordância com o fio condutor do seu discurso.
    E não se deve preocupar com a extensão deste seu texto. De facto, o blogue ainda continua a ser a forma mais adequada para nós nos permitir-mos explanar com o mínimo de coerência e rigor. De palavras ocas anda a Net cheia, particularmente através das chamadas redes sociais tipo Facebook e outras do género.

    Fiquei a pensar na forma de a Igreja resolver o dilema:

    Capitalismo solidário.
    Sem dúvida, teríamos um sistema muito interessante, se não fosse uma impossibilidade flagrante.

    Só mudando o Homem!...
    A Igreja Católica estaria disponível para iniciar este movimento?!

    Um abraço
    António

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  6. Caro António,

    penso que se refere ao Capitalismo Solidário, como uma forma de organização politico-económica que se encontra a meio caminho entre o Comunismo e o actual Capitalismo, a que alguns já convencionaram chamar Fundamentalismo de Mercado, o que me parece ser uma denominação mais adequada à realidade.

    Entendo esse ensejo, que no fundo significaria tentar chegar a um equilibrio entre dois pontos opostos retirando o que de mais positivo cada um deles tem para oferecer às sociedades.
    E referiu também, e bem, o factor Homem, que como bem sabemos é o factor de maior peso nestas equações.

    Não quererá esse termo Capitalismo Solidário dizer precisamente o mesmo que Socialismo (verdadeiro Socialismo) ?
    Eu penso que sim, António.
    Se formos ver bem o que defende um e outro, eu diria que a única diferença está na semântica.
    O termo Capitalismo Solidário, surge mais como um "modernismo" linguistico.
    Sabe, António, é que as palavras Comunismo e Socialismo (puro, e não aquele que por exemplo o PS cá do sítio defende e pratica) são termos que ainda dispertam numa grande franja da sociedade sentimentos básicos de perconeito.

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  7. Pois, Eduardo, trata-se basicamente de uma questão de semântica. O que traz logo por arrastamento, a ideia - tão extraordinária que eu a imaginava - do chamado Socialismo Democrático, preconizado pelas teorias dos fundadores do nosso PS. Tantos anos que militei em prol destes ideais!

    Como levá-los à prática sem os pôr na gaveta (do congelador...)?

    O Homem é um ser extremamente egoísta. Por Natureza. Deus, tal como apregoado pela Igreja Católica tem de ser posto necessariamente em causa, nos precisos termos dos cânones desta Santíssima Madre Igreja. Que Deus é este?!

    Além do mais temos também a considerar a iliteracia política e social do chamado Povo, daquele que vota, daquele que tudo decide com o voto. E que os eleitos tanto desprezam, vulgarizam, amarfanham completamente.

    Como é que o Povo, o votante num regime dito Democrático, como o nosso, consegue acreditar num sistema de organização política e administrativa duma sociedade que seja capaz de defender os interesse do Todo e não exclusivamente os de uma minoria, gorda, balofa, sedenta de poder, do luxo, do supérfluo, que só o lucro económico a qualquer preço, lhe pode proporcionar?

    Que grande dilema, este que se levanta ao homem em sociedade, ad eternum?...

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  8. Caro António, embora seja legitimo e expectavel que cada um de nós se reveja mais nesta ou naquela ideologia, a verdade é que se formos a lê-las todas com a devida atenção, praticamente todas elas nos parecem bem intencionadas, nos parecem boas.
    Aquilo que mais as pode diferenciar é a forma como as mesmas são, ou não, colocadas em prática.
    E em Portugal, nos últimos 35 anos, jamais tivémos um dia que fosse em que tenhamos vivido sob Socialismo Democrático.
    E talvez isso tenha acontecido, precisamente pelo egoismo que o Homem tem na sua Natureza, como bem referiu.

    Mas é precisamente por acreditar que é possível um país melhor e onde a justiça social seja uma realidade, que também eu milito (ainda que mais à esquerda que o seu Socialismo Democrático) por aquilo que entendo ser o melhor caminho para todos nós.

    Um abraço.

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  9. A visita do Papa a Espanha estava programada antes da crise económica.
    Os confrontos entre policias e contestatários foram políticas.
    Se fosse uma outra corrente religiosa tambem seria contestada....pergunto...
    Sou catolico e sei que houve erros e que nem sempre esta Igreja esteve limpa sendo apontada como exploradora, mas tambem tem sido uma forca de esperanca em muitas cidades e paizes com fome.
    No meio de toda a crise portuguesa encontra uma Igreja activa em ajudar e repartir sem estar a cobrar impostos.....organizando e levando o que podem a quem precisa

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  10. Amigo Luís, vamos lá ver se consigo responder a tudo.

    Apesar da visita estar programada já há algum tempo, a verdade é que a actual crise pedia, da parte da IC, uma postura algo diferente. Quem sabe um adiamento da mesma, ou então, uma comparticipação nas despesas, de forma a demonstrar uma maior sensibilidade com a actual situação de dificuldade que se vive em Espanha.

    Quanto aos confrontos, plenamente de acordo. Aliás, fiz menção a isso mesmo no post.

    Se fosse outra corrente religiosa ?
    Mas há alguma outra corrente religiosa que organize visitas com despesas colossais como a IC e cujo pagamento seja da inteira responsabilidade dos Governos dos países visitados ?
    Penso que não !
    Como tal, não haveria lugar a qualquer contestãção.

    Quanto às boas acções que alguns membros da IC têm praticado em Portugal, eu sei que elas existem, e até conheço casos concretos, que são louvaveis e que representam aquilo que, penso eu, deveria ser a postura de toda a IC e não apenas de alguns membros.

    Critiquei, e já não é de agora que o faço, a postura da IC, generalizando, é um facto, mas tendo bem presente que há muita boa gente ligada à IC que faz um trabalho louvável e de grande humanismo.

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