31 de maio de 2010

Gritos

Os gritos vinham de lá, do outro lado do morro que estava adiante do ribeiro. Aflito, correu até o atingir. Lá chegado, descalçou-se, despiu as calças e a camisa e atirou-se à água. Estava gelada, mas a sua ânsia de acudir aos aflitivos gritos tudo ultrapassava. Nadou com todas as suas forças, vencendo a forte corrente.
Alcançada a outra margem, subiu o morro com uma fúria total, usando os pés e as mãos, de gatas, dada a inclinação.
Atingido o cume, extenuado, nu, sem nada mais que o seu próprio corpo e o seu altruísmo, olhou para um lado, para o outro, até onde a vista alcançava, mas nada, não vislumbrava vivalma, e os gritos, esses, pareciam-lhe vir agora de trás, precisamente de onde ele tinha vindo.
Voltou-se, e com incredulidade, viu-se a si mesmo, do outro lado, aflito, gritando por socorro.
Paralisou.
Tudo em seu redor ficou suspenso, e só aí percebeu que estava diante da sua própria vida, e que a mesma lhe pedia que, pelo menos uma vez, olhasse por ela, a acudisse.

10 comentários:

  1. Anónimo1/6/10

    Forma cada vez mais apurada.

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  2. Achas Rui ?
    Vindo dum mestre, fico muito satisfeito.

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  3. .
    Uma maravilha, Eduardo. Parabéns :))

    Um abraço.

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  4. Obrigado Maria Josefa. Ainda bem que gostou.

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  5. Um grito puramente maravilhoso de se ler!

    Ora bem, tenho um tio cheio de talento para a coisa pa!

    Parabéns!

    Cada vez mais surpreendes pela positiva.

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  6. Eduardo, adorei o texto! Algumas pessoas são assim, atentas a tudo em redor, aos outros, e esquecem-se de si.
    Parabéns!

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  7. Querido sobrinho, para além do tio "maluco", há outro um nadinha mais ... sensivel !

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  8. Benjamina, há mesmo, acredite que há !
    O problema, é que às vezes, antes de se ajudar os outros, há que saber ajudar-se a si próprio.

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